Autor: Luis Pimentel
Caricatura: Carlos Amorim
Ela já me disse em uma entrevista:
“Degustei lágrimas como quem degusta vinho. Sei o gosto que elas têm”. Não foi apenas uma frase de efeito. Quem conhece um pouco de sua história sabe que ela comeu o pão que o diabo amassou, apanhou mais do que boi ladrão. Mas seguiu os ensinamentos do “Che” e não perdeu a ternura, jamais.
Elza Soares, uma das mais brasileiras entre as cantoras brasileiras chega aos 74 anos neste junho de 2011, no dia 23, cantando melhor do que nunca. Possui recursos vocais personalíssimos, arrancando as sílabas da garganta como se quisesse estourar as veias do corpo. Parece que “rói do cóccix ao pescoço”, como no verso da música que Caetano Veloso escreveu para ela e que virou título de um dos seus mais belos CDs. Outro que homenageou lindamente a garra da cantora, seu som em fúria, foi Chico Buarque. Lembrou o craque dos craques, na canção Dura na queda: “Apanhou à beca, mas pra quem sabe olhar/A flor também é ferida aberta/E não se vê chorar”. Do velho 78 rotações ao CD, são mais ou menos 100 discos gravados, no Brasil e no exterior. Nos EUA, resolveram examinar sua garganta e concluíram que as cordas vocais eram defeituosas. Um defeito perfeito. “Armstrong ficou deslumbrado quando viu que termino de cantar e falo normalmente, que esse som é puro efeito vocal. Ele me chamava de filha espiritual”. Não vai nesse depoimento nenhum excesso de vaidade. Simples relato. O sucesso enorme que fez com músicas como Mulata assanhada, Se acaso você chegasse, Língua, Malandro, Cadeira vazia etc., não mudou sua estrada, desde o início para cima: – Sou uma poderosa. Vitoriosa quatro vezes: mulher, negra, estrela e gostosa. Diz o último verso da canção do Chico: “O sol ensolará a estrada dela...”. A estrada sempre esteve ensolarada. Elza Soares é a verdadeira guerreira da luz.
Luís Pimentel
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